Resumos / Material
'
quarta-feira, 16 de junho de 2010
Os Melhores Contos - Rubem Braga
Postado por Marlon às 07:34
O gênero A
crônica é fruto do jornal, onde aparece entre notícias efêmeras.
Trata-se de um gênero literário que se caracteriza por estar perto do
dia-a-dia, seja nos temas, ligados à vida cotidiana, seja na linguagem
despojada e coloquial do jornalismo. Mais do que isso, surge
inesperadamente como um instante de pausa para o leitor fatigado com a
frieza da objetividade jornalística. De extensão limitada, essa pausa se
caracteriza exatamente por ir contra as tendências fundamentais do meio
em que aparece, o jornal diário. Se a notícia deve ser sempre objetiva e
impessoal, a crônica é subjetiva e pessoal. Se a linguagem jornalística
deve ser precisa e enxuta, a crônica é impressionista e lírica. Se o
jornalista deve ser metódico e claro, o cronista costuma escrever pelo
método da conversa fiada, do assunto- puxa- assunto, estabelecendo uma
atmosfera de intimidade com o leitor. A obra Os melhores contos
de Rubem Braga (1985) na verdade são 39 crônicas, selecionadas pelo
professor Davi Arrigucci Jr., que podem ser divididas em: 1. Passado
interiorano ou em Cachoeiro do Itapemirim - reunindo as crônicas em
que o narrador aborda, de forma lírica e nostálgica, a vida na cidade
pequena do interior, entre caçadas de passarinho, encontro com moradores
da cidade grande, peladas na rua, pescarias, cachorros amigos, e a
vegetação abundante do meio quase rural: 1. Tuim criado no dedo -
Menino, durante férias em cidade do interior, cria um tuim, o menor dos
periquitos brasileiros, "no dedo", ou seja, o ensina a obedecer seus
chamados e deixa-o viver livre, fora da gaiola. Quando a família retorna
a São Paulo, o tuim foge e é aprisionado por outra família.
Recuperando-o, o menino corta-lhe as asas. Mas, no instante seguinte, o
tuim é devorado por um gato. 2. Diário de um subversivo - No
"remoto ano de 1936", durante a perseguição getulista aos comunistas
após a Intentona de 35, o narrador apresenta sua fuga da repressão, em
forma de diário, do dia 15 de fevereiro ao dia 1o de março. Adotando
pseudônimo, finge-se alienado em conversas com integralistas que vivem
na pensão onde mora. Procurado pela polícia na pensão, é auxiliado por
velho conhecido, Edgar, que o abriga em sua casa. Ao poucos vai se
envolvendo com a mulher de Edgar, Alice. Afirma que se "tivesse qualquer
coisa com essa mulher, seria o último dos canalhas." Termina a crônica
afirmando laconicamente: "Sou." 3. A moça rica - Relincho de
cavalo desperta em pescador humilde a memória de uma moça rica que viera
do Rio. Usando calças, caçando e pescando, a moça de início o assusta,
mas, em seguida, ao cantar, o encanta. Dois anos mais velha do que ele,
pára um dia na praia solitária para conversar com o rapaz, que,
assustado e ingênuo, esquiva-se de suas tentativas de aproximação e
deixa escapar a chance de se envolver com a moça bonita e rica. 4. O
jovem casal - Casal jovem espera o bonde. Lutam contra a miséria
vivendo em uma pensão barata e suja. Vivem na feiúra de uma "vida
estreita". Não podem pegar o ônibus por ser muito caro, sofrem de dores
de cabeça e dentes, mas tratam-se com carinho e amor. Pára, à sua
frente, um automóvel de luxo com um casal. A mulher diz, no momento em
que o carro partia, que iria comprar um anel por quinze contos. O rapaz
ouve isto como se fosse um soco em seu estômago mal alimentado. Com esse
dinheiro, poderia pagar anos de pensão e aliviar o sofrimento de sua
amada. Chega o bonde. 5. Negócio de menino - Diálogo entre um
menino e o narrador, vendedor de passarinhos. O garoto vai intercalando
perguntas sobre os pássaros e pausas até pedir ao narrador um passarinho
de presente e depois sair correndo. 6. Coração de mãe - Marina e
Dorinha são irmãs e moram com sua mãe, dona de pensão no bairro do
Catete , no Rio de Janeiro. Loiras, de olhos azuis, vivem cantando.
Certa noite, as moças chegam já de madrugada e "um pouco tontas". A mãe,
dona Rosalina, briga com as filhas. No dia seguinte, ouve Marina ao
telefone referindo-se a ela como "a velha" e as expulsa de casa. Na rua,
o "cavalheirismo do bairro" se manifesta e as moças recebem várias
propostas de ajuda dos "bondosos homens". Porém, são interrompidos pela
mãe, que manda as filhas de volta para casa. Conclusão do narrador: não
há nada no mundo como o coração de mãe. 7. Marinheiro na rua - De
madrugada, na rua deserta, um "pequeno marinheiro" bate à porta de um
edifício às escuras, observado do alto e à distância pelo narrador. O
som da batida chega uma fração de segundo após o gesto, o que desperta
no narrador uma recordação da infância e, depois, uma série de idéias,
como a suspeita de que talvez o marinheiro fosse seu filho ou ele mesmo e
dentro do prédio estivesse sua amada. A porta não abre e o marinheiro,
cansado de bater, segue pela calçada até o narrador o perder de vista. O
narrador olha, então, para a fachada do prédio e todas as luzes se
acendem. O edifício fica maior e começa a se mover como um grande navio,
partindo lentamente. 8. O homem da estação - Numa aldeia, na
França, o narrador procura hospedagem para passar a noite. Ninguém lhe
dá abrigo. Anda pelo campo e um homem de bicicleta pára e lhe pergunta
se precisa de alguma coisa. Responde que não achou lugar para dormir e
está indo para outra aldeia. O homem indica ao narrador onde fica a
estação da estrada de ferro em que trabalha e informa que virá um trem
em duas horas. Quando chega na estação, o homem lhe preparou uma cama e
lhe oferece vinho. O narrador bebe "em silêncio à saúde de um homem que
não teme nem despreza outro homem. 9. Falamos de carambolas -
Narrador conta uma conversa com uma amiga (?) em um bar. Falam de
sorvetes e frutas até que ele pergunta o que o médico disse. Ela
responde vagamente que era uma síndroma e não iria se enganar. O
narrador afirma que é pessimismo dela. Ela nega, hesita, mas não
pronuncia o nome da doença, para alívio do narrador. Mudam de assunto e,
enquanto conversam, o narrador pensa que é insuportável saber que ela
morreria. Ela critica o seu bigode e ele pergunta por que ela não toma
conta dele. Ela "ri uma risada... clara, alegre, ... como o cristal...,
que se parte tão fácil." 10. Era uma noite de luar - O narrador
conta sobre uma noite, na época da repressão do Estado Novo, em que foi
levar notícias à Marina, mulher de Alberto, um militante comunista
preso. Descreve as precauções que tinha que tomar e a conversa com
Marina, que está sem dinheiro, solitária, triste e cansada de se
esconder. Durante a conversa, o narrador abre uma banda da janela para
jogar o cigarro e comenta que o luar está bonito. Ela se aproxima da
janela e ele abre a outra banda. Então ela fecha a janela com
brutalidade, chama-o de estúpido, pois "está sozinha desde a prisão do
marido", manda-o embora, atira-se na cama e começa a chorar. 11.
Viúva na praia - Narrador conta que viu a viúva na praia com o filho
e deitou-se na areia para contemplá-la. Conhecera vagamente o marido
dela no café da esquina, onde soube que ele ficara muito tempo doente
antes de morrer. Descreve a beleza da mulher e pensa que, se fosse ele o
marido, ficaria ressentido ao saber que, poucos dias depois da sua
morte, um estranho estaria olhando o corpo de sua mulher, mesmo que
discretamente. Mas ele é o outro homem, está vivo, e sente-se, por isso,
superior. Descreve a viúva depois de um mergulho e conclui que o sol
ama a viúva. 12. A navegação da casa - O narrador é um senhor,
brasileiro, que saiu do hotel e está numa casa antiga, em Paris. É
abril, início da primavera. Seus amigos fazem uma festa. O narrador
sente-se alegre e diz que a casa parece uma velha fragata tripulada por
bêbados. Quando a festa termina, anda sozinho pela casa, imaginando os
invernos difíceis que os antigos moradores lá passaram. No dia seguinte
está muito frio. Os amigos chegam e ele acende todas as lareiras. As
luzes são apagadas e o narrador - diante do fogo - imagina que lá estão
também os fantasmas dos antigos amigos. Lembra de um sagüi - presente
para a sua noiva, que ele, por distração, deixara morrer de frio em Belo
Horizonte, assim como "matamos, por distração, muitas ternuras". Por
fim, pensa em meninos, "em um menino". 13. Aula de inglês -
Crítica ao famoso "método Berlitz ", de ensino de línguas através de
perguntas e respostas. A professora pergunta em inglês, ao aluno (o
narrador), se determinado objeto é um elefante. Após uma cuidadosa
análise, ele responde que não. Pergunta, então, se é um livro;
prontamente o narrador responde que não. Pergunta se é um handkerchief
(lenço) , palavra que o aluno não conhece, mas acha antipática e
responde que não. À última pergunta, se é um cinzeiro (ash-tray ), o
aluno responde que sim. A reação eufórica da professora faz o narrador
sair satisfeito da sua primeira aula. Pensa em comprar um cachimbo
inglês e, se encontrasse o embaixador britânico, imagina "entabular uma
longa conversação", em que diria que o cachimbo não é um "ash-tray". 14.
Caçada de paca - O narrador conta que uma conversa sobre paca o
levou a abandonar a rede, onde descansava, embaixo da mangueira e sair à
noite para caçar paca, acompanhado por Anti. Depois de muito andar na
noite escura, subindo e descendo morro, pensam que viram uma paca,
atiram e matam um cachorro. Discutem se havia paca mesmo, mas na verdade
estavam bêbados. Chegam de madrugada e as mulheres ainda riem deles.
Para o narrador, Deus fez o domingo, o brasileiro armou a rede e o Diabo
inventou a paca. 15. A partilha - Dois irmãos se separam e o
narrador transcreve o que um deles, o mais velho, diz, enquanto fazem a
partilha dos objetos da casa. Ele deseja ficar com a rede, o retrato da
mãe e, principalmente, o canivete do irmão mais novo. Enquanto
argumenta, as características de cada um vão sendo descritas, do ponto
de vista do mais velho, que sabe pescar e lidar com o canivete, além de
fazer os consertos da casa. O mais novo ganha mais dinheiro, escreve
cartas e tem namorada. Através do monólogo, nota-se que o mais novo
ameaça o irmão com o canivete e este lhe dá o conselho de nunca puxar
canivete para outro homem, pois é arma de menino. É melhor dar um tiro
com garrucha. Diz que se o matasse naquele momento estaria matando um
inimigo, não seria como ele "que levantou a arma contra um irmão". Pega o
canivete, reclama que o irmão não presta nem para limpá-lo, mas é bom
para outras coisas e despede-se. 16. Noite de chuva - Homem está
em casa em noite de temporal, após um dia difícil. Antes de dormir,
pensa que há muitos anos adia consertar as coisas, dos dentes a um caso
sentimental. Começa a dormir quando Joaquina Maria, "negra velha" que
lavava as suas roupas, bate na porta e pede ajuda para tirar o corpo do
neto dos escombros do barraco, que fora derrubado pelo temporal. Nada
está funcionando na cidade. Deixa a velha na entrada da casa, tenta
parar uns carros, bebe uma bagaceira e conta a história num botequim ,
sentindo que era ridículo o que fazia. Volta para casa pensando que de
nada ia adiantar se conseguisse telefonar, pois não conseguiria
assistência com aquela chuva. Encontra a velha chorando e diz secamente
que arrumou tudo "para amanhã de manhã". Ela vai embora, com um ar
desamparado. 17. Os perseguidos - Durante a repressão do Estado
Novo, o narrador, acompanhado de Moreira, que ficara um mês preso e fora
torturado, chegam ao apartamento indicado. O narrador "tem pena e
desgosto" de Moreira, que está sujo e mal vestido. Uma empregada de
uniforme os atende, pede que entrem e se sentem. É uma sala luxuosa com
uma janela imensa com vista para o mar, que surpreende o narrador: o mar
dos ricos é mais amplo, puro e azul do que o mar dos pobres, visto lá
embaixo. O narrador inspira o ar salgado e limpo e tem a impressão de
que aquele ar não é dele e ele nem o merece, já que o ar dos pobres é
quente e parado, com poeira e fumaça. 18. A mulher que ia navegar
- Mulher é observada pelo narrador, enquanto se desenrola, numa roda de
intelectuais, conversa sobre pintura. Além da mulher e do narrador,
participam da roda o marido dela, "todo bovino", um pintor, uma senhora,
um físico e uma outra senhora desquitada. A mulher, junto à janela,
está atenta às mudança de cor em seu braço, provocadas por um anúncio
luminoso de um edifício em frente. Quando o marido refere-se a certo
pintor com uma palavra vulgar, a mulher o olha com "menos zanga do que
tédio" e o narrador sente que ela se preparava para enganá-lo, como "um
belo barco prestes a se fazer ao mar". Ela procura e escolhe o físico
para ser o " piloto de longo, longo curso" com quem vai navegar. 19.
Força de vontade - Narrador conhece comerciante em hotel em Foz do
Iguaçu. Ele não tem vícios, é solteiro e mora em São Paulo, com os pais.
Durante a conversa, o comerciante comenta que está realizando o último
dos seus três ideais: visitar pelo menos um país estrangeiro. Outro
ideal, já cumprido, era ter um diploma. Depois do jantar, o narrador
cumprimenta o comerciante por ter realizado seu ideal "em duplicata",
afinal visitara dois países, Argentina e Paraguai. O comerciante afirma
que provou a sua força de vontade e que, para isso, passara por muitas
dificuldades. Mais tarde, o narrador o convida para um passeio de carro,
ele recusa e fica no saguão do hotel. Quando o narrador volta para
buscar a sua lanterna, o comerciante está com um ar "vazio como quem não
tivesse coisa alguma a fazer na vida e acabasse de descobrir isto". 20.
O espanhol que morreu - Em um bar no bairro da Lapa, no Rio de
Janeiro, o amigo do narrador é confundido com um espanhol, já falecido,
que freqüentava o lugar, era amigo de todos e amado de Sueli. As
mulheres, Sueli e Betty, dizem que são idênticos, com a mesma cara
triste e jeito de falar. O amigo do narrador se aborrece, diz que "não é
espanhol, não trabalha no comércio e nem sequer está morto". As
mulheres contam casos do Espanhol e como foi o seu enterro. O garçom
pergunta se ele é irmão do Espanhol. Quando saem, algumas mulheres
acompanham os amigos até a escada e o narrador diz ao amigo que aquela
despedida era o enterro dele. O amigo, bêbado, sai andando na chuva,
falando espanhol e some. O narrador o procura, mas não o encontra e
conclui que "na verdade ele é o Espanhol, e morreu". 21. O rei
secreto de França - Em Paris, na primavera, o narrador tem um
encontro marcado com uma mulher. Enquanto espera chegar a hora, visita o
túmulo de Maria Antonieta e conversa, distraído, com o guarda do lugar.
Está ansioso e pensa que se sentia o rei secreto da França porque a
"mais fina e bela mulher da França" viria ao seu encontro. Corre ao
casarão, local do encontro, toma mais dois conhaques. A mulher chega e
diz que aquele seria uma despedida, pois partiria para "remotas
suécias". Ao sair, vai telefonar, enquanto ele entrega a chave do
apartamento 14 à velha "concierge"e paga em dobro. A velha diz para ele
nunca perder uma mulher como aquela. A mulher sai da cabine , ele beija a
sua mão, ela entra no táxi chorando e o narrador a descreve como "a
futura Rainha da Suécia, das distantes suécias e noruegas do nunca
mais." 22. Visita de uma senhora23. Praga de menino - O narrador conta que, quando menino, ele e
seus amigos jogavam bola na rua, em frente à casa das irmãs Teixeiras .
Elas eram "suas inimigas" porque brigavam com eles devido ao barulho
que faziam e o receio de que quebrassem alguma das inúmeras janelas da
casa. Um garoto trouxe uma bola maior e colorida e um dia essa bola
quebrou uma vidraça. Uma das irmãs, depois de brigar com eles, cortou a
bola com um canivete. Os garotos se vingaram entrando na casa delas
quando não havia ninguém, fizeram uma grande bagunça e roubaram um anel
sem valor, uma lata de goiabada, uma faca de cozinha e um martelo.
Ninguém descobriu quem foi. Os meninos nunca mais jogaram bola diante da
casa das Teixeiras e deixaram de cumprimentar aquela que havia cortado a
bola. O narrador não sabe se ela foi feliz, mas "se foi, é porque praga
de menino não tem força." 24. Um braço de mulher - Em um vôo Rio
de Janeiro- São Paulo, o narrador ocupa-se em acalmar uma senhora
sentada ao seu lado, aflita porque o avião, sobrevoando São Paulo,
demora a descer. Quando sugere trocar de lugar com a amiga da senhora,
ela diz que prefere ter um homem ao seu lado. Ele sente-se útil e
responsável. A senhora se acalma e o narrador começa a pensar que
realmente estava demorando muito para pousar. Tem a idéia de que a morte
deveria ser assim: um nevoeiro imenso... para sempre". No entanto, a
senhora volta a se preocupar e o narrador de repente repara que ela tem
um braço "belo, harmonioso e musculado ". Então sente-se despertar, e a
idéia da morte, antes agradável, agora é "uma coisa sem a delicadeza e o
calor, a força macia de um braço ou de uma coxa..." No aeroporto, o
marido da senhora agradece formalmente ao narrador, que se sente um
intruso, como se tivesse traído aquele senhor. A senhora lhe dá um
pequeno sorriso, "vagamente cúmplice". O narrador diz que certamente não
a verá mais, mas vai demorar para esquecer de seu belo braço que,
"durante um instante, foi a própria imagem da vida". 25. Conto de
Natal - Despedidos da fazenda em que trabalhavam, casal de colonos
com filho de seis anos caminha em direção à Fazenda Boa Vista, a duas
léguas e meia do lugar em que se encontram. A mulher está grávida de
oito meses. Começa a chover, ela não pode mais andar. Conseguem carona
num carro de bois e chegam à noite na fazenda, que está fechada.
Alojam-se junto a um burro e a uma vaca num lugar coberto. Durante a
noite, o menino nasce. O carreiro chega e lembra que é Natal. O marido,
Faustino, sugere à mulher que chamem o recém-nascido de Jesus Cristo. A
mulher não acha graça. O menino de seis anos chama o pai para ver o
irmão, embrulhado em trapos em cima do capim. O pai olha. A criança está
morta. 26. Lembrança de Zig - O narrador lembra de Zig , o
cachorro de sua família, quando era criança em Cachoeiro do Itapemirim. O
cachorro era conhecido na cidade por Zig Braga, mordia a todos que
estivessem de farda e tinha um profunda amizade por uma gata, com a qual
dormia. Essa amizade só se esfriou quando a gata teve cria e os
filhotes incomodavam o cachorro. Também seguia pela rua quem saísse da
casa e, principalmente, a mãe do narrador, que tinha de prendê-lo quando
ia à missa aos domingos. Muitas vezes, ele se soltava e, para desgosto
do padre e dos fiéis, cheirava a todos na igreja até encontrar a mãe do
narrador, quando então latia e abanava o rabo. Hoje a mãe do narrador
está velha e não vai mais à igreja, que é distante. O narrador conclui
que Deus deve mandar um santo de vez em quando visitar a sua mãe, na
antiga casa e, ao voltar, este deve "se demorar um pouco sob o velho pé
de fruta-pão", onde Zig foi enterrado. 27. Os amantes - O
narrador conta sobre os seis dias que passou trancado no apartamento com
sua amada, sem atender telefone ou abrir a porta, desfrutando de "um
entendimento que era além do amor". Na manhã que a fome os deixa tontos,
ele sai e compra uvas. No entanto, quando volta, o "pequeno mundo" dos
amantes foi invadido (o carteiro está lá, o telefone toca e "agora é
preciso atender", as janelas estão escancaradas) e "o milagre se
acabara". No "lento olhar" da mulher, entretanto, "ainda havia uma
inútil, resignada esperança." 28. O sino de ouro - O narrador
conta que, em uma localidade no sertão de Goiás, há um sino de ouro numa
pequena igreja, cujo som puro se estende, à tarde, pelas matas e
cerrados e dá aos homens pobres do lugar uma "ração de alegria". Os
habitantes acham que vivem do sino de ouro, não se importam com nada,
fazendo somente o essencial para viver. Não estão interessados em
progresso, negócios ou corrupção. O narrador afirma que ouviu essa
história de um homem velho, que a contou com espanto e desprezo. Depois,
o narrador contou a história para uma criança, cujos olhos diziam que
"a coisa mais bonita do mundo deve ser ouvir um sino de ouro". O
narrador acredita que Deus, mesmo que não exista, deve ter a mesma
opinião. E conclui que nós, quando crianças, temos, dentro da alma, um
sino de ouro que com o tempo vai virando "lama e podridão". 29. A
primeira mulher do Nunes - Na praça Serzedelo Correia, em
Copacabana, o narrador vai tomar um táxi e vê uma mulher bonita, com ar
de estrangeira, sentada num banco do ponto de táxi. Tem a impressão de
que a mulher o segue com os olhos quando se dirige para o táxi e, ao
partir, tem a certeza de que tinha visto Marissa , a primeira mulher do
Nunes. Explica que nunca a conhecera, devido a uma série de
desencontros, mas chegara a se apaixonar, há uns quatro ou cinco anos,
graças à descrição que faziam dela e ao momento ruim porque estava
passando. Ela ficou sendo um mito e aquela mulher vista na praça em
Copacabana correspondia à imagem que o narrador fazia de Marissa. No
rápido olhar que trocaram, o narrador acredita ter "lido" a irônica
mensagem de que o destino deles era o de nunca se conhecerem. 30. O
cajueiro - Uma carta da irmã do narrador contando sobre a queda do
velho cajueiro que ficava no alto do morro, atrás da casa de seus pais,
desperta lembranças da sua infância. Ele descreve como os meninos, à
medida que cresciam, iam conhecendo a árvore e que, no último verão,
levou Carybé para vê-lo de perto, como quem apresenta a um amigo um
parente querido. 31. Encontro - O narrador encontra casualmente,
em um bar, antiga namorada. Compara a sua beleza e jeito de mulher com a
imagem que trazia dela quando jovem. Ao despedir-se, o seu olhar lhe dá
a certeza "de que nem tudo se perde na confusão da vida e que uma vaga
mas imperecível ternura é o prêmio dos que muito souberam amar." 32. O
afogado - Homem consegue se salvar de morrer afogado, sem pedir
ajuda. Esgotado, deita-se na areia da praia e sente-se superior às
pessoas que estão conversando sobre cinema numa barraca próxima - "uma
idiota superioridade de quem não morreu, mas podia estar morto". 33.
Madrugada - O narrador sonha com a mulher que estivera na festa na
sua casa. Acorda de madrugada, vai até a varanda e descreve o nascer do
dia, o mar, os pescadores preparando-se para a pesca, os pássaros
despertando, o silêncio da casa e as sensações que a madrugada
despertava nele. 34. História de pescaria - O narrador conta a
pescaria feita por ele, Zé Carlos e Manuel, motivados pela notícia de
que um marlin fora visto na Praia Azedinha. Não encontraram o marlin,
mas ele fisgou "um olho-de-boi que tinha seus vinte e cinco quilos" e
ficou lutando com o peixe durante mais de uma hora. Porém, o peixe
quebrou a linha quando a hélice do barco foi ligada, e fugiu. 35. O
mato - No entardecer de um dia chuvoso, no Rio de Janeiro, homem se
afasta da cidade e anda lentamente por um morro próximo à sua casa.
Pensa na nervosa vida da cidade, depois volta a sua atenção para a
natureza, sente paz e vontade de se tornar uma árvore, sem desejos e
sentimentos - "forte, quieto, imóvel, feliz". 36. Do Carmo - Na
praia, o narrador encontra um velho amigo. Conversam sobre o passado,
lembram de amigos de vinte anos antes e falam de Maria do Carmo, sua
beleza e seu encanto. Esta lembrança os aproxima mais. De repente,
correm para o mar e mergulham, com o sentimento de que a água limpa
também a poeira que a passagem do tempo vai deixando na alma. 37.
Visão - O narrador descreve como, no meio de um dia cinzento, no
centro do Rio, a visão de uma mulher que, por um instante, lhe fitou e
sorriu de dentro de um carro fez com que se sentisse como um preso que
visse "uma parede se abrir sobre uma paisagem úmida e brilhante de todos
os sonhos de luz." 38. As luvas - O narrador encontra um par de
luvas atirado atrás de uns livros e imagina que sejam de uma mulher que o
visitara duas vezes e sumira há mais de uma semana, dizendo que
telefonaria. O telefone toca, mas não é a dona das luvas. Ao sair para
um jantar, segura as luvas "como se tivesse na mão um problema" e as
joga atrás dos livros, "onde estavam antes." 39. As meninas -
Narrador recorda a imagem de duas meninas em uma praia, com vestidos
compridos, azul e verde, brincando no mar, acontecida há muito tempo.
Evoca o sentimento de angústia "leve, quase suave" que a cena produziu
nele. - O narrador atende a porta e
entra uma moça bonita. Segue-se um diálogo em que o narrador responde
"claro" às três primeiras perguntas. A mulher afirma que ele não a
conhece, que mora no bairro, é casada, já tinha visto o narrador na
praia e pergunta se ele só sabe dizer "claro". Diz que há muito tempo
lia o que o narrador escrevia, e que uma vez ele escreveu algo como se
conhecesse todos os segredos dela. Depois pergunta se ele é homem mesmo,
chama-o de cínico e afirma ser uma pena ele ser tão velho Então o
narrador pergunta o que ela deseja, ela responde que "que gosta muito do
marido" e de repente começa a chorar. O narrador sugere que ela vá
embora. Ela retoca a pintura, despede-se e vai "embora para nunca mais".